Por que personagens 3D são trabalhos complexos?

Publicado em por Maiara Araújo

Olá, tudo bem? Nesse artigo irei trazer meu processo de produção de um personagem em 3D. A modelagem 3D depende de muitos conhecimentos, sejam eles técnicos ou sejam eles dentro dos softwares. Há um tweet irônico do modelador e instrutor co-fundador da FlippedNormals que ilustra muito bem isso:

Look, I don't know why people say it's hard to learn 3D. You just need to know Maya, Blender, Painter, ZBrush, Photoshop, Nuke, Arnold, lighting fundamentals, anatomy, sculpting, texturing, color theory, composition, and hotkeys for all software under the sun
Henning Sanden @henningsanden

E com isso, irei listar as etapas, desde a blocagem do personagem, até a conclusão de uma fanart que fiz nesse ano de 2022 para mostrar o processo. Para esse trabalho, não passei pela etapa de “Concept de personagem”, pois me baseei em um clipe musical com imagens de referências de mundo real.
Pontuo que esse workflow abaixo é para modelagem orgânica, ou seja, modelos que irão receber deformação, que irão posar. Para modelagem inorgânica (também chamada de hard surface) usamos outras etapas.

Etapa 1 - Blocagem

Software: Z-Brush

Aqui é onde começamos a escultura, onde construímos as proporções, formas primárias, volumes e a silhueta do personagem. É como se fosse o esboço. Tome ciência de que não é porque seu personagem não é estilo realista e sim cartoon, que não devemos seguir os fundamentos da anatomia.

Depois de feita a blocagem, unimos as formas, suavizamos a superfície, adicionamos os detalhes e exportamos para o Maya.

Bibliografia obrigatória para saber mais sobre esse assunto: Anatomy for Sculptors, Understanding the Human Figure - Uldis Zarins and Sandis Kondrats

Etapa 2 - Retopologia e modelagem de acessórios

Software: Maya

Aqui iremos reconstruir a malha e redesenhamos a topologia (o fluxo dos polígonos na malha).
Uma boa topologia nos auxilia em vários aspectos, um deles é que otimizamos o tempo de renderização (explicado na etapa de Render) e o aspecto mais importante, é que sem uma topologia adequada, não conseguiremos fazer a deformação adequada.

Do lado esquerdo não temos retopologia e temos 5.711 polígonos, veja que a deformação não é precisa e até mesmo muito pesada. Já do lado direito após eu ter feito a reconstrução da topologia, temos 1.852 polígonos e a deformação é fluida.

E o processo de retopologia é desenhar polígono por polígono, seguindo os principais loops de deformação, por exemplo, dos olhos, da boca, a dobra da pele nas juntas, etc.

Resultado depois de preenchido:

E após modelar os acessórios menores:

Bibliografia obrigatória para saber mais sobre esse assunto:
The Pushing Points Topology Workbook 1 - William Vaughan
Digital Modeling - William Vaughan

Etapa 3 - Abertura de malha UV

Software: Maya

A abertura de malha (também chamado de unwrap) consiste em projetar uma imagem 2D na superfície do modelo 3D. Basicamente é pegar seu objeto 3D e planificar ele para pintar a textura em cima.

Uma forma simplista de se explicar o que é a abertura UV:

Fonte original da imagem: Desconhecida.

E a forma simplista de se explicar como a gente faz na projeção:

Trecho retirado do episódio de Chaves “A máquina de lavar”

Abaixo mostro como fica antes de abrirmos a malha:

E após a projeção, o corte, o relaxamento, a checagem de distorção/escorrimento com a textura de teste e a organização das ilhas/shell UV:

Etapa 4 - Texturização

Software: Substance Painter e Photoshop

Agora é hora de se sujar! Ao menos com pixels.

Bibliografia obrigatória para saber mais sobre esse assunto: Color and Light: A Guide for the Realist Painter - James Gurney

Etapa 5 - Rig e Setup

Software: Maya com DP AutoRig

Com o auxílio do plugin de Danilo Pinheiro: o DP AutoRig posso colocar os controladores nos locais e gerar o esqueleto (chamado de Rig) do nosso personagem que irá ser aplicado no nosso modelo e nos permitirá posá-lo.

E então é necessário fazer a pintura de peso, que é manualmente controlar o quanto e onde cada joint (as “juntas”) irá deformar.

Bibliografia obrigatória para saber mais sobre esse assunto: The Art of Visual Storytelling, Tina O'Hailey

Etapa 6 - Cabelo

Software: Maya com Xgen

EEssa etapa é para os modelos em que o cabelo não é uma geometria e sim em fios. Uso o X-gen e primeiro modelo a geometria de base que servirá como forma para os fios, depois modelo o couro cabeludo de onde os fios irão nascer, converto as edges da geometria de base em guias, adiciono no X-gen e a partir daqui é trabalho de formiguinha ajustando fio a fio e ajustando modificadores para obter o resultado desejado.

Etapa 7 - Iluminação

Software: Maya

A iluminação da cena dependerá do que e qual efeito quer obter como resultado. Para a iluminação de exposição de objetos, por exemplo de seu personagem, uso a técnica de iluminação de três pontos (“Three point light” em inglês). Essa técnica consiste em adicionar três luzes principais: a Key, que é a luz direta principal; a Fill, que é uma luz direta que somente preenche o outro lado de seu objeto/personagem; a Back, outra luz direta que cria aquela silhueta bonita no contorno de seu objeto. Para alcançar melhores resultados, adiciono também uma luz específica que unicamente ilumina os olhos, para dar aquele efeito de sparkles/brilho no olhar e adiciono outra de preenchimento, que é uma luz indireta para ajudar nas luzes de rebatimento, que seria a luz ambiente.

Bibliografia obrigatória para saber mais sobre esse assunto:
Digital Lighting and Rendering (3rd ed) - Jeremy Birn
Lighting for Animation - P. Jasmine Katatikarn and Michael Tanzillo

Etapa 8 - Render

Software: Maya com V-ray

A forma técnica de se explicar o que é render é que é um cálculo que o software faz para gerar e calcular a luz e a textura aplicada. Essa é a hora em que precisamos esperar o programa construir a imagem, calculando cada luz e sombra nos detalhes de cada objeto em cena. O tempo de espera irá depender de vários fatores, um deles é a máquina que temos (é necessário termos uma placa de vídeo potente), se há ou não animação (em média são de 24 a 30 frames por segundo), a densidade de polígonos nos nossos objetos (veja a importância da retopologia aqui!) e resolução de nossas texturas.

E o que há para se fazer basicamente é…

…esperar.

Etapa 9 - Auto-avaliação

Aqui é vai e volta. Renderizar e verificar o que ainda há para se melhorar, erros a serem resolvidos e receber sugestões de melhorias vindas do cliente, de colegas e da coordenação do projeto.

Etapa 10 - Pós-Produção

Software: Photoshop

Agora é hora de reunir todos os passes (também chamado de Render Elements), adicionar o AO (Ambiente Occlusion) para dar mais profundidade, intensificar ou suavizar sombras e luzes conforme necessidade, aplicação de filtros e efeitos.

Etapa 11 - Anotações e conclusões

E depois de finalizado e entregue, sempre faço anotações do que eu poderia ter feito melhor e quais dificuldades ainda tive no projeto, uma lista para visitar depois nos próximos projetos e estudos e saber onde devo evoluir.
Todos os dias aprendemos algo e é isso que faz com que fiquemos animados e curiosos com o que esse novo dia nos proporcionará.

E por fim, veja o resultado dessa fanart nos links abaixo:

Artstation
Behance
Instagram

Obrigada pela leitura!
Nos vemos em breve!